quinta-feira, 22 de abril de 2010

Amor.

—Você não se importa?
Eu hesitei durante alguns segundos, ainda pasmo com o seu pedido. Fiquei em silêncio, em um mínimo de tempo suficiente para que ele não percebesse que eu estava pensando seriamente sobre o assunto. Qual seria o motivo que o fez mudar a sua forma de pensar tão repentinamente? Seja lá qual fosse, não adiantaria nada que eu continuasse a me questionar. Se ele conseguiu dar dois passos à frente, com certeza, seria mais fácil para eu acompanhá-lo.
—Não. — respondi, não tendo total certeza da minha decisão.
Quando ele me puxou pela cintura em uma movimentação perfeitamente calculada, eu já sabia que não teria como eu voltar atrás. Ele afagou uma de minhas mãos, levando-a até o seu pescoço, com grande cuidado. Com aquele olhar semicerrado vidrado em mim, junto com a sua expressão focalizada ambiguamente em carinho e apreensão, ele urrou sua vitória. Ele tinha conseguido me convencer. Agora, nem se eu quisesse, eu o largaria. Tentando não tremer, tentei prestar atenção nos passos e por sorte não tive dificuldade, já que ele estava facilitando as coisas para mim ao me guiar lentamente. Em primeiro lugar, ele apoiou seu tato em minhas costas, e com um giro sobre o ritmo lento da música, logo desceu para a cintura. Ele firmou sua postura bem ali, com a outra mão estendida, apertando a minha direita, decidido no que pretendia fazer. Como eu previa, aos poucos, as pessoas começaram a notar nossa presença, comentando entre si em vozes baixas. Assim que ele me percebeu expirar de insatisfação, tentou me confortar.
—Se concentre na música. Deve ajudar.
—É meio difícil me concentrar com qualquer outra coisa quando estou tão perto de você.
Ele sorriu espontaneamente, clareando toda a minha confusão com seus dentes mais brancos do que o normal.
—A culpa é sua. Seus olhos é que fixam a minha atenção.
Algumas pessoas se sentaram. Estávamos quase a sós na pista, e isso aumentava a minha tensão, pois parecia que mais gente estava olhando. No fundo, eu não queria perturbar ninguém. Odiava esse tipo de situação. E mais uma vez, ele pareceu ter lido minha mente.
—Esquece isso. Vamos falar sobre alguma coisa. — propôs pensativo em um tom de voz sereno bem baixo. —Que tal sobre a gente... Sobre o amor?
Meu coração gritou de emoção, batendo em tonificações rápidas. Pelo menos, a sua idéia tinha funcionado. Eu não pararia de dançar por nada desse mundo.
—O que o senhor tem para falar do amor?
—Ah... É que o amor é tão utópico. Tão difícil de encontrar. A gente conhece alguém. E surgem tantos empecilhos. Primeiro, a gente tem medo de se apaixonar. A gente nunca sabe quando a pessoa vai sumir. Mesmo com confiança, tudo pode mudar. Ou então a gente se apaixona e se decepciona depois ao conhecer a pessoa mais a fundo.
—Até mesmo o amor tem seus medos e dores. — respondi, mordendo meu lábio inferior ao perceber seu olhar se aprofundando sobre os detalhes de meu rosto.
—A gente nunca pode se entregar por completo. Quando a gente gosta, não podemos dar muita corda, senão a pessoa acaba perdendo o interesse. Quando fazemos o contrário daquilo que queremos, ou seja, quando ficamos longe, a pessoa dá mais valor.
Ele apertou forte a minha mão, queimando minha palma, no transporte do seu calor ao meu, que se espalhava com voracidade.
—O medo e a confusão são inimigos que surgem bem no início da relação. É normal que as pessoas fiquem com pé atrás.
—Mas mesmo no meio, ou no final. É chato ter que pensar que as coisas têm um fim.
—A vida tem um fim. — minha voz ríspida deu uma rasteira em seu diálogo. Ele fechou a expressão, tentando não encarar a verdade. Eu tentei continuar o discurso, chegando com a boca próxima ao seu ouvido, entregando meus sussurros.
—Mas que seja infinito enquanto dure.
Ele estremeceu. Quando eu voltei a fitá-lo, ele ainda estava atordoado.
—Eu não gosto de pensar nessas coisas. Em morte, ou coisa do gênero. Pensar nisso tira a confiança das pessoas.
Eu o interrompi, imerso de dúvidas que gritavam em minha cabeça.
—Você age assim?
—Como?
—Você geralmente não se entrega?
—É... Eu não sou de confiar nas pessoas.
Agora foi a vez dele de me dar uma patada. O ritmo da música agitou, e eu pude aproveitar a chance de me esvaziar com a sua frase dita anteriormente. Mas o tapa ainda ardia em meu nariz.
Eu soltei na dança o que estava preso em mim. Aproveitei a firmeza da sustentação da sua pegada para passar uma perna para o lado oposto da onde eu me movia, sucessivas vezes, sentindo meus pés deslizarem ao chão. Eu soltei sua mão bruscamente, empurrando seu tórax para longe de mim, e correndo em seguida, tentando reconquistá-lo. Só que dessa vez, eu subi com a mão pela sua nuca, ficando a menos de um palmo de distância dele. Puxei seu cabelo com dificuldade — de tão curto que era— tentando lançar um charme, mas ao mesmo tempo, tentando descontar em raiva, a dor que ele havia causado em mim. Mas me arrependi tremendamente, fazendo algumas cócegas para amenizar o dano causado.
—Com você é diferente.
Eu quase tropecei. Não consegui tirar forças para responde-lo. Antes de prosseguir, ele soltou a respiração, me fazendo desfrutar do ar caloroso que irradiou minha pele.
—Eu sinto que por mais que eu me entregasse, você jamais me recusaria. Como se eu pudesse sempre exagerar... É que o meu amor por você é tão intenso, que tende a escapar da razão.
Soltei o ar bruscamente para não desmaiar, me assustando por conseguir me defender.
—Não mais do que eu. Não sei até onde posso ir por você. Se você deixar, vou até as estrelas.
—Acho que só pelo fato de você estar dançando comigo diz muita coisa.
A gente riu por um momento mágico.
—Eu te amo. Embora, meu amor por você já ultrapasse qualquer amor já existente. Não sei como expressar o que eu sinto com palavras, por isso preciso acreditar nessas três. Vou confiar com que elas transmitam o que eu sinto por você.
Ele sorriu, engolindo meu murmúrio.
—Eu amo você. — completou, com a sua pele bronzeada corando.
A pista de dança por algum milagre tinha se enchido de novo. Não sei quantas músicas se passaram, embora eu desconfie que fossem muitas, pois meu tempo ao lado de Taylor sempre passava rápido. Talvez as pessoas tivessem se conformado de que a gente não iria sair dali tão cedo, cedendo chance a diversão.
Ele ergueu uma das suas sobrancelhas, com um ponto de interrogação em sua cabeça. Logo depois, abriu a boca, sem deixar sair algum som. Ele a fechou, ainda confuso. Abriu novamente, mas voltou atrás mais uma vez.
—Diga. — eu o incentivei. Após uma longa inspiração, ele soltou.
—Posso te beijar?
Eu entendia perfeitamente o seu drama. Mas eu não estava em condições de dizer um “não”. Eu não o respondi. Era muito óbvia a minha resposta. Uma mão desistiu de minha cintura, acariciando meu rosto ao brincar de lá para cá. Ele queria fazer tudo bem devagar. Com um suspense que subia por toda a minha coluna vertebral, se transformando abruptamente em uma vontade insana de agarrá-lo, eu tentava manter a minha consciência. Tentei prender a minha vontade de avançar, mas ele persistia em me atrair, exatamente como um imã que atrai uma pequena limalha de aço. Ele tocou meus lábios lentamente, só para sentir o sabor. Com um remorso imenso, ele subiu até minha orelha, só para morder-la a fim de aperfeiçoar sua implacável provocação. Ele voltou contente até a minha boca, só que dessa vez muito mais rude. O gosto de Taylor se apossava sobre os cantos da minha língua, tornando-se parte de mim. O formato do seu beijo acostumou-se com o modelo do meu, e junto com uma sede insaciável que só crescia dentro de mim, eu retribui. Coloquei minha mão em seu rosto, só para me equilibrar e surtei com o seu hálito celeste contagiante.
Do nada, bem repente, o cenário a minha volta, regido ainda pelo inconsciente — porém perdoável — preconceito, mudava de cor. Antes ele era preto em branco. Mas agora, cada cor explodia, pintando em uma textura misturada uma famosa obra de arte: o nosso mais verdadeiro amor.

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