segunda-feira, 3 de maio de 2010

Lucy.

Fechei a janela lateralmente. Puxei suas extremidades de fora para dentro em um brusco ato que terminou com um estalo. O som produzido foi bem alto, capaz o suficiente, para incomodar meus próprios ouvidos.

Sentei na cama, meio atordoado de pensamentos, tentando controlar a raiva que aos poucos consumia minha racionalidade. Ela tentava escapar se apossando do meu corpo, embora eu não permitisse o sucesso do seu objetivo. Ao longo da minha maturidade, eu finalmente havia me tornado um inimigo capaz de combatê-la.

Aos poucos fui esvaziando cada pensamento ruim, um por um, tentando amenizar o que lutava — agora descontroladamente — contra a minha calma, codinome: consciência. Porém, eu sabia que por mais que eu tentasse esquecer aquele importúnio, jamais consegueria eliminá-lo de uma forma completa, pelo menos não ali, naquele exato momento.

Olhei através da transparência da janela, tentando buscar respostas que talvez estivessem em algum lugar, qualquer um que fosse. Nas estrelas brilhantes, no vento que eu não podia sentir, na Lua que fazia a sua melhor cena espetacular. Mas é claro que não obtive resultado. Até que de repente.

—Julinha. — suspirei.

Meu suspiro foi como um vômito incontrolável. As palavras invadiram minha boca sem eu ao menos perceber, com grande tonificação. Eu estava tentando manter os dentes cerrados, mas mesmo assim, por alguma fresta, qualquer uma que eu tenha sem querer deixado se abrir, elas me escaparam.

A minha história com a Julia é tão longa que se eu começasse a contá-la com todos os detalhes, eu viveria a maior parte da minha vida, sentado na frente desse computador, redigindo capítulo por capítulo. Mas pensando de uma forma equilibrada, até que não me parece uma má idéia, já que, toda vez que eu me lembro dela, me invado com tudo o que é composto de felicidade.

Em um inexorável jato de gostos parecidos, uma bela amizade foi valorizada. E tudo começou com uma grande explosão, tudo rápido demais. Em pouco tempo de convivência, nós dois já sabíamos que era impossível vivermos um sem a presença do outro. Com o crescimento, esse pensamento de posse desfaleceu-se, dando origem a uma nova convivência, mais saudável e resistente, porém mais distante.

Por um tempo eu realmente pensei, que fóssemos ser para sempre "Rafael e Julinha", porque por mais que as pessoas cruzassem nossas vidas, nós dois sempre estávamos lá, trocando nossos olhares, como respostas de uma grande combinação confirmativa.

Mas esse núcleo foi-se perdido. Depois de um tempo, a gente percebe que não é a dupla que emerge como centro de um todo. E sim cada integrante nela contido. O reflexo da depêndencia têm como produto um caminho percorrido em velocidades médias proporcionais. Nesse tempo, nós andamos juntos. O individualismo costuma chegar como um soco no estômago — bem repentino — desprovido de qualquer reação. O comum seria simplesmente agonizar com a falta de ar, esperando até que ele preencha novamente a superfície de contato dos alvéolos pulmonares.

Assim que o sofrimento se esvai, ganha-se uma boa anestesia. Duvido que você vá cair ao chão tão facilmente, com qualquer outro soco recebido. É a formúla mágica do amor próprio entrando para ser resolvida na primeira equação retílinea. É como praticar Matemática, só se pega o jeito depois que se lota a caixinha de experiências.

Os contras surgem como grandes demotivadores. Quem é radical costuma chegar ao máximo. Tanto eu na paixão, quanto ela na ausência. E agora, por mais que andemos juntos, temos mundos separados. Só que por um destino contraditório — ou não — é exatamente por isso, que cada vez mais nos fortalecemos.

Durante um tempo, não andamos na mesma direção, e até acabamos soltando nossas mãos. As borboletas agora estão livres para saírem de meu jardim e retornarem assim que sentirem vontade. Essa negligência, por um bom tempo, foi uma escolha feita pelos dois. Até nas escolhas somos parecidos.

Esclarecendo melhor, eu nunca em nenhum momento esqueci da Julia. Até porque é simplesmente impossível não me lembrar dela em qualquer parte do dia.
Mas sempre tive uma confiança tão grande nesse ser pequeno (só de tamanho, e eu tô falando da altura, não dos peitos) que eu sabia que tinha uma parte dela comigo, assim como havia uma parte de mim, nela. Eu não precisava me preocupar, ela iria voltar.

Ansiedade é medo guardado, muitas vezes trancado. O tempo de ausência traz uma mudança desconhecida por aqueles que não podem acompanhar. A prioridade havia sumido, exatamente como as faces engraçadas, as piadas, tristezas e diversões. (Sim, a cada dia eu sentia mais saudade de todas elas, 'sem exceções' — a própria essência da Julia). Se ela sempre voltava, o que a fazia ficar tão longe? Teria ela mudado tanto que estaria simplesmente em outra?

Amizades por mais fortes que sejam, uma hora se distanciam por dívidas da vida. Quanto mais forte a corrente for, mas dificil há qualquer rompimento. Mas como qualquer planta que precisa ser regada todos os dias, acho que o nosso jardim passou por um período prolongado de seca. E nada se sustenta sozinho. A culpa foi totalmente nossa. Mas não me arrependo disso. Não me arrependo de nada que eu passei ao seu lado. Quando a vida oferece um sonho além de todas as suas expectativas, é irracional se lamentar, quando isso se chega ao fim.

Eu sofri. Sofri por ter que decidir. A ausência da Julia provocava uma dor extrema no meio do meu peito. As vezes parecia que as minhas costelas iam ser deslocadas em posições opostas a fim de esmagar meu coração (que nesse período gritava de forma ensurdecedora). E de uma coisa eu tinha certeza, eu quero que a Julia seja feliz. Ela merece. Depois de tudo o que passou, a coisa mais bonita que ela pode passar é ser feliz para sempre. Exatamente igual aquelas histórias de vampiros e lobisomens o qual o amor prevalece na frente de tudo. Se não do meu lado, no de outra pessoa. E forçá-la a mudar -por mim- estava fora de cogitação.

Eu desisti do seu sorriso contagiante (as vezes de madrugada eu fico rindo alto das nossas brincadeiras) porque não podia enfrentar a ferida que regia minhas lembranças e sentimentos. Minha paixão por ela, acompanha meu amor de uma forma polida, composto de um material que não pode ser desgastado. Mas foi por um bem maior: o brilho que ficou eternizado em meu espírito, só por saber que em algum cantinho do mundo ela estaria lá dando as suas risadas inesquecíveis.

(Chora) Depois de um período intenso de solidão, ela finalmente entrou no meu quarto. E não era um sonho. Para o meu bem maior, ela simplesmente fincou do meu lado. Simplesmente depois que conversamos (retrospectiva de três anos seguidos de casamento) e nos abraçamos, eu senti seus braços em volta da minha nuca. Como se eles me prendessem ali, naquele aperto incontrolável que me fazia perder o fôlego. Como se ela não quisesse se afastar de mim nunca mais. E não vai.

"Parece fácil, mas é difícil, um belo você vai ter que aprender. Burro!" O belo dia, tinha chegado para gente. Foi mais mágico do que o comum, mais impercetível que qualquer inspiração ou piscar de olhos. Só que dessa vez não havia barreiras, nem máscaras a serem tiradas e sim a mais pura realidade, o nosso verdadeiro amor. O amor entre duas pessoas, mas que vinha simplesmente de dentro de cada uma delas.

Sendo assim, entrelaçamos nossas almas gêmeas até um tempo determinado.

E que seja infinito, enquanto durar.

Do seu Rafael. Eu te amo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário